Olá

Bem vindo a partes de mim



sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Dialogando com estrelas

Minhas voz decidiu por escorregar os becos lamacentos da minha alma sem fazer barulho
já era tarde da noite quando me veio o primeiro deslizamento
- o segundo resolveu-se por cair só mais tarde, lá pros quintos ou sextos raios do dia.
A marca que ficou no chão não era profunda, mas um tanto quanto firme. Daquele jeito que só a lama fria, quando enrijece no chão, sabe ficar.

Era um pensamento que, de tanto crescer em si, ficou pesado demais para aguentar as lágrimas da chuva.
Caiu feito fruta madura do pé. Um cacho que esqueceu de considerar a força do galho em que se apoiava - esqueceu o mundo ao redor, não viu que sua sustentação não dependia só de si; quando deu por conta, já era parte do vento ao encontrar seu caminho ao chão.

Foi ao perceber-me enquanto mortal. Não só criatura que decompõe, envelhece, falece; mas enquanto ser mortal, atingível, perfurável. Ser humano, não blindado de auto-cuidado, mas vulnerável tanto quanto qualquer outro pedaço de carne que se rasga. E por ser humana, de pele ainda mais rasgável, sensível não só aos metais, mas também a toda vã criatura que nos decida cruzar o caminho. É a finitude e tudo que ela representa em si - a exposição, que traz o calor do sol, como também as pragas ao meio dia.

Calcular a espessura é imprescindível nas estradas da vida. "Tudo é uma questão de medida". Da mesma necessidade em que surgem as fronteiras limítrofes entre nós e os outros, vem também o anseio para que não façamos de tais divisas muros inalcançáveis e inabaláveis.

A única coisa que sei é que habita em mim um ser. É incrível isso! Pense: um ser. Alguém que não só sente, mas também pensa e observa tudo ao seu redor. Tece histórias, constrói laços, certezas, caminhos. É gente. E mais bestificante ainda: todas as pessoas ao meu redor cultivam em si seres tais como esse. Vivos, pulsantes, incansáveis.

Somos seres e compartilhamos a mesma dimensão de tempo e espaço, os átomos, as correntes elétricas, o ar, os risos, às vezes a comida, uns abraços, outros olhares... Somos gente vivendo com gente.

Temos medo, temos ausências. Temos por vezes a coragem, que ainda nos falta estampar na cara; mas que nunca nos falte a bravura de ir além. Que nunca deixemos de dar aquele suspiro antes da corrida, o impulso inicial. Somos a poera estelar que insiste em dimensionar em si só um quasar. Somos a soberba boa de nos vermos enquanto capazes de brilhar - e que por isso, brilhamos. E também a humildade de compreender que o de mais valia é um sorriso se desenhando no rosto.

É de amor que somos feitos. E crescemos ao conservar essa matéria dentro de nós. O cuidado de olhar nos olhos, se abraçar com afeto, de compreender e se fazer ser compreendido. É lidar, não suportar, não aceitar, não tolerar, mas de fato, conviver - viver, ser.


A voz lamacenta do meu coração, ao se arrastrar deixa seu rastro de sujeira, que é pra eu não esquecer, não fingir que não vi: somos gente. Tenhamos o cuidado de observar: os outros, mas também - e sempre - nós. Pois nós, enquanto que ainda assim gentes, somos mortais, findos, expostos. E só cavando por nossa própria mortalidade é que criamos em nós a firmeza, o amor e a felicidade capazes de nos tornar eternos.


Nenhum comentário:

Postar um comentário