Olá

Bem vindo a partes de mim



domingo, 25 de dezembro de 2022

2022

são as luzes de fim de ano de novo
dessa vez tive coragem pra fugir da socialização excessiva e dos fogos agoniantes.
não tive coragem de fugir de mim.
fazia meses que eu aguardava esse encontro
o fim de ano tem esse jeito de recomeçar as coisas dentro da gente
carta de intenções, desejos - não mais - suprimidos
a releitura do ano
uma tarefa tão simples que teria me poupado meses de agonia
mas que só agora sou capaz de fazer
belchior se decepcionaria com quantas vezes eu fui capaz de morrer em um só ano
mas só agora - e talvez só por isso
eu pude juntar todas as partes de mim
dois diagnósticos, uma doença crônica e uma deficiência
o autismo escancarado e as dores da endometriose me deixando louca
fazer 25 e perceber que o mundo não esperou
meus amigos não eram amigos 
e abusar de quem acha que precisa correr o triplo pra fazer o mínimo é fácil demais
eu decidi pausar a vida por 365 dias
mas a vida não tem pausa
de olho no meu objetivo, eu sangrei hemácias e sal
nos olhos e nas veias eu abri mais caminhos do que era permitido pensar
o mundo gritava e eu rodopiava sem destino
meu único destino era um caminho sem final
lutar contra si mesma dói
mas você já experimentou lutar contra o resto? 
ninguém fala a verdade, mas é bem pior
pela primeira vez eu soube exatamente quem eu era
e não adiantou de nada
o mundo continuou me atropelando
e de novo de novo de novo
esperar um abraço é esperar um milagre que não vem
eu abracei o caos
e abraçaria de novo
tudo que me fizesse, pela primeira vez, deixar de morrer ao fim do dia

morri mais vezes do que seria digno admitir
e só renasço uma vez
é o fim do ano, é o fim do ciclo, é o fim da porra do que aconteceu
leio bell hooks pra não esquecer de acreditar na ética amorosa
mas queria quebrar tudo que aparece na minha frente
passei meses no meu próprio velório
chorando por tudo em mim que morreu 
hoje eu agradeço: ainda bem que morreu, já não morre mais
o socorro não está vindo
e eu sou a única que posso me abraçar
esse ano pode enterrar com ele toda a dor que trouxe
e eu vou ser tudo que eu sempre quis. 

sexta-feira, 17 de junho de 2022

eu achava que o amor era a coisa mais forte do mundo
um pé de juazeiro que permanece verde mesmo quando a seca devora tudo ao seu redor
mas a verdade é que o pé de juazeiro só sobrevive à seca porque rouba água de todas as plantas
mesmo as mais distantes
e o amor pode até ser forte, mas nem sempre é saudável


ser dois não pode ser maior do que ser um.
a matemática diz o contrário 
mas a grandeza da nossa existência exige solidão

meu erro é mergulhar de cabeça em águas que mal cobrem os pés
aprendi a nadar em rio, e pra mim toda correnteza é infinita e desemboca no mar
mas faz tempo - agora que eu vi
as águas daqui são aprisionadas, não correm livres
achei que ia dar pé
me afoguei em água rasa

setembro de 2021.



quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

 

Eu observo o mundo!

É o que posso dizer a quem me pergunta

Qual o seu dom?

Eu vejo o verde cada dia mais verde

E o azul cintila de forma quase mágica

Eu vejo o cinza dos prédios e da fumaça e da gente

A gente fica cada dia mais cinza

Eu vejo muita dor também

Diria que me especializei em medos, absorvo todos eles

Luz e escuridão são apenas duas pontas do mesmo sol

Não são opostos

São complementares

Eu observo o mundo

E de tanto observar eu fico cansada

Tem dias que quero sentir menos

Queria não enxergar desprezo e arrogância que escapam entre dedos durante o sorriso estruturado

Queria não sentir o peso da soberba num abraço

Queria não sentir tanta angústia ao andar na rua

Mas assim eu não veria o verde.

Não sentiria os milênios do mundo ao mergulhar no mar

Não leria o amor nos olhares

Não seria eu.

Luz e escuridão são dois versos do mesmo poema

Não se distanciam o suficiente para serem moedas

Eu sou o que sou, porque sou.

Eu observo o mundo!

E ele também me vê.